Portal da Tribo de Estrelas – VII – Invoquem-se todos os deuses e santos para um único milagre

Pensei que hoje falaria do ano de 2005, mas, que nada. Ainda tem muito assunto das fases anteriores. Por volta de 2004, ainda chamávamos os ideários de vivências. Eu conhecera os escritos de George Ivanovich Gurdjieff e compreendera os objetivos dificílimos da sua jornada: tornar pessoas comuns em pessoas notáveis. A versão para o grupo Tribo de Estrelas chegou com a proposta de inspirar pessoas a buscarem internamente suas capacidades virtuosas, até o alcance intencional e prático da cidadania cósmica, este grau evolutivo que faz de cada ser um agente corresponsável pelo funcionamento ideal de tudo e todos.

Naquele período eu meditava diuturnamente sobre deuses, anjos, santos e avatares, na esperança que todos se unissem para gerar um único milagre: conscientizar o máximo de pessoas a cuidar do jardim dos sentidos, aqui na Terra, qualificando-os para praticar a fraternidade, haja vista que em milênios, todos haviam aprendido tão somente competir, seguindo consciente ou inconscientemente a lei do mais forte, espelhada e difundida pelo evolucionismo darwiniano. Por incrível que pareça, ali eu estava devastado internamente, porque descobrira abismado que as religiões estavam completamente equivocadas.
Eu insistia em me calar, porque os vislumbres que me vinham eram assustadores e se falasse a respeito, decerto, confundiria as pessoas, aliás, o que ocorre até os diais atuais. Ao mesmo tempo, que respeitava e respeito religiões, pressentia que estas instituições eram responsáveis por grande parte das desavenças de rotina entre as pessoas. 
Quem é Deus, afinal, se as quatro maiores linhas de crenças defendem proposições diferentes para se chegar ao céu ou ao inferno? Qual o papel da Ciência e o que de fato vem a ser a evolução dos seres humanos no planeta? Existe céu? Existe inferno? Quem é o demônio?
Tínhamos de optar entre ficar com os preceitos empedrados das velhas escrituras, que nunca conseguiram estabelecer paz, união e igualdade entre pessoas, povos e nações e a evolução do pensamento para regenerar este óbvio fracasso. 
O maior dos dilemas religiosos é admitir o fracasso das escrituras. Os profetas viram aspectos das crenças com a lente do conhecimento de uma época, quando a funcionalidade cósmica era desconhecida. Não agiram de má fé quando instituíram os diferentes modelos de fé, mas estes não podem permanecer cristalizados, desconsiderando o desnudamento científico que pôs em xeque os dogmas, causando as profundas contradições e absurdos que se verificam por causa dos credos, alguns insalubres, quando confrontados com a inteligência.
É evidente que quem acredita no mundo sobrenatural, mantendo dúvidas sobre as escrituras e procurando evoluir internamente, livre da pressão religiosa, está muito mais próximo de uma crença ideal. 
A falha está em acreditar ferrenhamente que sua religião é poderosa e divina, porque, na verdade: ou todos nós alcançamos o grau divino de ser e de estar ou ninguém alcança. 
O único milagre esperado é que toda pessoa se desenvolva participando do desenvolvimento de todos. Este é o ideal de fraternidade que as religiões não aceitam, porque agem e reagem, segundo a intenção dogmática das suas escrituras seculares, sabidamente fracassadas e causadoras das deturpações comunitárias a que assistimos todos os dias.
Pergunto de novo: afinal, quem é Deus? O que quer Deus? Somente os profetas antigos souberam? Por que não apareceram novos profetas? Por que Alá é tão exigente? Por que o Deus de Abraão é tão conservador, rígido e inflexível e contraditório? Por que Jesus é respeitado por menos de um terço da humanidade? Por que somente a versão Oxalá aceita a condição libertária da natureza homossexual de algumas pessoas? Por que brigam tanto, por que gritam tanto, por que matam tanto por causa da fé? Por que existem líderes religiosos tão violentamente contra recortes de realidades novas?
Para mim, que já houvera andado em igrejas católicas, evangélicas, centros, templos e frequentado complexos holísticos e esotéricos, o jardim dos sentidos estava malcuidado e causando avaria nas mentes e nos corações. 
A minha solidão visionária me atordoava. Por isso, a chegada do Ricco e a permanência de uns poucos comigo me eram alentos fundamentais. 
Não há como ser espiritualista sem ser honestamente cheio de dúvidas, mas sem perder a espiral do bem coletivo, planetário e cósmico. Aqui surge o eixo das proposições da Tribo de Estrelas. Temos de ser inteiros, como propôs Fernando Pessoa, numa das odes de uns dos seus heterônimos, Ricardo Reis:
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.'
Era difícil transmitir tudo isso ao grupo de pessoas que me respeitavam. Na verdade eu não tinha competência, como disse antes, para ser tão claro como sou agora. Hoje é fácil resumir as propostas da Tribo de Estrelas em quatro grandiosos pontos:
1)      A oração de São Francisco é um tratado que, se seguido, revoluciona e soluciona todas as equações humanas. Anula milênios de prédicas inócuas. O Resto é proselitismo, misticismo e fundamentalismo. Eu orava sob a inspiração de São Francisoco e concluia que tinha de apostar todas as minhas energias e potencialidades em algo que configurasse uma prática honesta da espiritualidade.
2)      A ideia de Gurdjieff, somada ao trabalho de transformar pessoas simples em cidadãos cósmicos, elimina competições e auxilia na imensa tarefa de considerar irredutivelmente a fraternidade como modelo único de bem estar na Terra. O trabalho maior está no planeta e não nas hostes espirituais. Precisava deixar os espíritos em paz e executar tarefas sagradas no dia a dia. Nisso consiste o trabalho atual da Tribo de Estrelas. 
3)      A inspiração do poema de Fernando Pessoa, que, inclusive, faz com que tenhamos a lua como grande exemplo metafórico da própria condição humana. A lua e suas fases demonstram nossa enorme luta para sermos inteiros. Os ritmos lunares representam as oscilações que experimentamos, enquanto buscamos as alturas dadivosas das nossas ações e reações. É essa grandeza que a Tribo de Estrelas quer despertar e faltam agentes para nos ajudar. Ainda assim não vamos desistir. A partir de 2004, eu não tinha dúvidas do que tinha de ser feito.
4)      Por fim, o método de abordagem, quase impossível de ser conseguido. Lendo um poema magistral de Manoel de Barros, foi como se estivesse diante de um espelho terrível, mas era de fato o que eu era perante meus amigos, meu companheiro e perante o futuro grupo Tribo de Estrelas. Ali, eu descobri que para restaurar iluminuras nas pessoas eu tinha primeiramente de inspirá-las a abrir suas mentes, por mais rígidas que fossem e tinha de fazer isso como se utilizasse uma espécie de parafuso de veludo. Noutras palavras: é preciso mudar tudo, mas não de qualquer jeito. O jeito que eu não tinha é que afastou muita gente boa, o que me põe e me expõe até hoje como um aprendiz, ainda não tão humilde, mas estou a caminho.
Bem antes de 2005, as vivências inventadas eram para despertar algo que eu ainda não sabia, mas a pureza de intenções fazia com que acertássemos, mesmo quando errávamos e exagerávamos. Lembro-me das vivencias em Itatiba, nos sítios que alugávamos, nas experiências de viagem e nas diversas tentativas de inspirações benévolas. Lembro-me de como expunha as pessoas, perante as outras e me envergonho, mas também compreendo que tudo fazia e faz parte da fundamentação da espiral luminosa da qual participamos agora.
Nas chapadas, queríamos que todos, ao entrarem numa caverna, notassem as escuridões interiores de si e que se propusessem a enfrentar suas sombrias maneiras de ser e de estar. 
Em São Tomé das Letras, onde fomos nove vezes, inclusive, com Óregon e Aleaia, as cavernas e cachoeiras nos alinhavam aos elementais. (vide foto ilustrativa de São Tomé das letras, que utilizo para lembrá-los do famoso: "ver para crer").
De tudo e antes de continuar buscando o campus definitivo e a filosofia íntegra da Tribo de Estrelas, eu tinha de saber o que eu queria, para onde eu estava conduzindo algumas pessoas boas que estão comigo até agora.  E de novo, Manoel de Barros e sua poesia me ajudaram. Este poema que transcrevo me revela.
“Com pedaços de mim eu monto um ser atônito.
Tudo que não invento é falso.
Há muitas maneiras sérias de não dizer nada, mas só a poesia é verdadeira.
Não pode haver ausência de boca nas palavras: nenhuma fique desamparada do ser que a revelou.
É mais fácil fazer da tolice um regalo do que da sensatez.
Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada; mas se não desejo contar nada, faço poesia.
Melhor jeito que achei para me conhecer foi fazendo o contrário.
A inércia é o meu ato principal.
Há histórias tão verdadeiras que às vezes parece que são inventadas.
O artista é um erro da natureza.  Beethoven foi um erro perfeito.
A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nossos mais fundos desejos.
Quero a palavra que sirva na boca dos passarinhos.
Por pudor sou impuro.
Não preciso do fim para chegar.
De tudo haveria de ficar para nós um sentimento longínquo de coisa esquecida na terra — Como um lápis numa península.
Do lugar onde estou já fui embora.
Em 2004 tudo era claramente difuso e era como se eu estivesse partindo dos lugares antes da hora. Tinha apenas uma certeza: fora da fraternidade verdadeira e da honestidade de propósitos não existe evolução.