Quadros de família II - gente que ri

Pertenço a uma família que costuma ri dos assuntos mais sérios e dos mais triviais. Nossa veia de humor é visceralmente perspicaz e costumamos sair pela tangente do bom humor quando somos abatidos por tristezas e ou tragédias. Elenco aqui algumas dessas situações.

 

Comadre Selma é também minha prima e tem um toque finíssimo de humor. Por ela relembrei de dois fatos ocorridos tendo o avô Sindolfo como protagonistas.

 

1. Vovô, já bem velhinho apresentava uma protuberância significativa no baixo ventre. Sabe quando a hérnia desce e quando não é feita a cirurgia, a coisa vai crescendo, crescendo, crescendo, dificultando inclusive a caminhada masculina. Diz a Comadre Selma que vovô chegou na sua casa distribuindo algumas moedas para a criançada, como ele fazia sempre que ía lá. Depois que colocou as moedas nas mãos das meninas, uma delas, parece que a Silvange, bateu com certa força na volumosa protuberância de vovô, perguntando-lhe: tudo isso é moeda? Vovô apenas riu.

 

2. Outra muito engraçada sobre vovô também contada por comadre Selma é a seguinte: nos anos 50/60, os delegados dos distritos eram nomeados pelas autoridades máximas que cuidavam da segurança do Estado. Escolhiam-se geralmente os homens mais respeitados do lugar, o que o avô Sindolfo era e decerto ter sido escolhido não foi difícil. Tudo estava muito bem no distrito de Riachão do Bacamarte até que por lá chegaram os capangas de um dos cangaceiros mais afamados do Nordeste, não sei se de Lampião ou de Virgolino. Os cabras deram de frente com vovô e lhe perguntaram: quem é o delegado daqui? Vovô tranquilamente respondeu: aqui não tem delegado, a gente está aguardando a nomeação.

 

3. Agora, tenho uma prima chamada Ana que é filha de tia Rita que é a versão moderna da tia. Ela não deixa passar nada. Contou que uma pessoa de Riachão fez um exame de útero e ovário e chegou contando o resultado dos exames:

 

paciente: olha, Ana, não te conto, minha filha. O médico disse que estou com um micro sistem no ovário. Ana embasbacada não riu, mesmo sabendo que a moça estava falando de micro cisto. E deu corda.

 

Ana: é mesmo, mulher e ele não disse que marca é, se é sansung, mitsibishi, Philco ou alguma marca importada?

 

paciente: mulher, sabe que eu não perguntei, mas eu vou voltar no médico semana que vem e eu pergunto, viu?

 

Ana: pois é, mulher, pergunta a ele se caso tu engulir um CD, por onde é que o som da música vai sair.

Paciente (espantada) - ôxe, mulher, que conversa mais sem pé e sem cabeça.

 

4. Ana costuma comprar remédios em Campina Grande para as pessoas que não podem ir à cidade e aproveitam sua ida. Ela faz isso sem cobrar nada e com a maior boa vontade. Deram-lhe uma receita, ela comprou o medicamento e o farmacêutico lhe explicou que aquele medicamento era de uso contínuo. Ela ao entregar o remédio repetiu o que ouviu do farmacêutico e foi embora. Passou uns minutos e a pessoa que encomendara o medicamento bateu na porta de tia Rita:

 

pessoa: Ana, minha filha, eu lhe pedi para comprar um remédio normal e não de uso contínuo.

Ela: menina, e eu sou ninguém para mudar a sabedoria do farmacêutico, não, minha filha. Ele disse que era de uso contínuo e pronto. Não posso fazer nada.

 

Pessoa: ô Ana, e o que é contínuo, hein?

Ana: ôxe e eu vou saber, acho que é alguma coisa que tem a ver com contionete. O problema é no ouvido, é?

 

5. Da mesma Ana, sobre a internação do papai. Papai foi acometido por uma pneumonia, esteve internado e melhrou rapidamente, depois de cinco dias de internação. Mas uns dez dias depois começou a sentir dores fortes na região peniana e no ânus, depois viemos saber que era uma crise de próstata. Mas papai não sabia como falar onde doía, talvez por vergonha. As pessoas que cuidam dele indagaram de todos os jeitos e nada, até que Ana chegou.

 

Ana: ô tio Barreira (o apelido de papai), onde é que dói hein?

papai: perto da coxa.

Ana: (apalpando a coxa): dói?

papai: não.

Ana (apalpando todas as partes das coxas de um lado e do outro): dói, tio?

papai: não.

Ana: (tocando nas partes íntimas de papai) ao ouvi-lo gemer gritou: ôxe, tio, porque que o senhor não disse logo que o que estava doendo era a pimba, homem de Deus?

papai: riu-se entre gemidos. 

 

Por causa dessa dor papai foi novamente internado em estado delicado e tivemos de revezar os acompanhantes no quarto. O diagnóstico veio no dia que a Ana não estava de plantão. Quem estava era a Branca, a irmã dela. Quando o médico disse do que se tratava, Branca não entendeu nada, mas fez cara de quem entendera. No outro dia, Ana chegou para render Branca.

Ana: ele passou bem de ontem para hoje?

Branca: passou, mulher, mas o médico falou de umas coisas que não entendi nada.

Ana: repete o que ele falou.

Branca: ôxe, e eu sei lá. Só me lembro que o médico disse que o problema de tio Barreira é na região digital.

Ana: região digital? Onde será que fica isso nas pessoas? cruz credo, cada lugar que a gente tem e não sabe.

Branca: pois é, minha filha, eu até sonhei com isso. No sonho, a região digital era um lugar que a gente não sabe onde fica nem para que serve.

Ana: que nada mulher, se o médico disse que o tio tem um problema nessa região é porque a região existe. Vou já perguntar à enfermeira.

Enfermeira (entrando): bom dia, minhas filhas, tudo bem?

Ana: vai ficar bom quando a senhora me disser onde fica e o que é a região digital.

Enfermeira: ô, querida, é região genital, essa parte aqui, entre o pênis e o ânus.

Ana: mas mulher, que besteira é essa, hein, por que vocês não diz logo que o problema da pessoa é entre o furico e a pimba, hein?