O mundo é dos corruptos (2a e última parte)

 
Faz algum tempo sinto preguiça de falar em Política. O noticiário geral, os diálogos e o conjunto de ideias em evidência e defendidos por diferentes pessoas se aproximam de um bestiário, indigno de quaisquer atenções.
 
A crise democrática é intensa e estrutural, agravando-se a cada dia e alastrando-se por níveis e graus impensáveis. 

 

No Plano mundial, as nações vivenciam conflitos de interesses delicados e por isso as decisões tomadas guardam sempre intenções de categoria baixíssima, usando-se, para vencer as questiúnculas, artifícios como ameaças com ataques, represálias, bloqueios, trapaças, espionagens, terrorismo, dentre outras estupidezes inconfessáveis pelos serviços secretos e ou que não vazam das reuniões e dos conchavos de gabinete.

 

Nunca houve e talvez não haverá jamais um Plano para reestruturar a Democracia no mundo, porque as diferenças de opiniões, plausíveis e inerentes ao sistema democrático são terrivelmente fracas em qualidade e fortíssimas em suas proposições e acentuações.
 
Ódios seculares entre grupos religiosos distintos (inconcebíveis e paradoxais, porque entre religiões), manobras de poder motivadas apenas pela detenção de poder (incompreensível eticamente), poder bélico para garantir grandes negócios regionais (algo nojoso, porque em se tratando da paz, as negociações não poderiam levar em conta o fator econômico) e poderia enumerar aqui dezenas de tópicos, todos incongruentes quanto à conquista de uma Democracia plena no planeta.
 
Em algumas regiões como nos Estados Unidos, na Europa e em alguns países latino americanos temos o básico exigido pelos parâmetros democráticos, como livre iniciativa, liberdade de ir e vir, talvez um pouco de liberdade de expressão, instituições fortes contracenando as oscilações dos poderes, mas no geral, a democracia está combalida, mesmo nestes lugares, porque não chega ao mínimo de plenitude, haja vista a desigualdade, o nível de pobreza, a concentração de rendas, a corrupção (esta praga) e a representatividade deficitária em todas as esferas do poder, sejam municipais, estaduais ou federais.
 
Dos anos 80 para cá, além da globalização econômica e tecnológica, acentuou-se a incapacidade generalizada para resolução de conflitos, por causa principalmente dos diferentes sistemas empedrados, espalhados pelo mundo. Vide as Coréias, a China, Cuba, os países islâmicos, a eterna e mesquinha contenda entre israelenses e palestinos, além do despudor entre os blocos comerciais e econômicos. Some-se a isso a volubilidade do dinheiro dirigida por grupos fortíssimos, detentores de um poder que se sobrepõe às soberanias de todos os países do Mundo. Evidente que a Democracia há muito é apenas um nome e está profundamente abalada em seu espírito.
 
Não existe um esforço conjunto para que o espírito democrático e ético ocasione o eixo de todas as definições. O planeta não pode ser mais visto pelas lentes regionalistas. Já passou da hora de tratar o planeta como um único Estado, diferenciado naqueles pontos imutáveis do ponto de vista cultural, religioso, étnico, etc, mas com o compromisso amplo de que a Democracia tem de ser o primeiro e o último meio para recomposição das forças governamentais e funcionais de cada nação.
 
De novo não se consegue isso, pela ordem, por causa de Religião, Ideologia ultrapassada, apego ao poder pura e simplesmente, Conservadorismo, Militarismo, preconceito étnico e acima de tudo o dinheiro. Por essas e outras, a Democracia está na UTI.
 
A situação é tão grave que se houvese a reunião de uma junta de filósofos e ideólogos, mais os homens notáveis de todo o mundo, acrescentando-se as pessoas mais honestas, éticas e mais bem intencionadas com a Humanidade, dando-lhes total autonomia e a certeza de que suas decisões seriam acatadas incondicionalmente, ainda assim, haveria um impasse assustador.
Faltaria gente confiável para executar o plano geral fidedignamente em todas as partes do mundo. Talvez ocorresse diminuição de conflitos, de desigualdades, de corrupção vertical (a existente nos governos), mas o fracasso rondaria o novo funcionamento no tocante à corrupção horizontal (a existente nos indivíduos, quanto aos seus interesses pessoais e pontuais). Novamente o dinheiro faria a diferença, coisa que só se combate com ética e ética é algo muito relatvo.
 
Por isso, quando o assunto é Política todo mundo fala e ninguém tem razão, por mais que pareça tê-la. A visão parcial é o que há de consistente em Política. Aliás, a corrupção vertical é tão grave que, por exemplo, o cartel dos trens, criado pelas empresas internacionais, levou 30 anos para ser parcialmente descoberto e ainda assim sem culpados visíveis. Imagine a infinita gama de falcatruas que jamais saberemos.
 
Temos um quarto poder, o midiático deprimente, que é investigativo quando lhe convém, que é sensasionalista e partidário quase sempre e tendencioso na maioria de seus assuntos. São empresas, agem como empresas e o dinheiro, a corrupção e de novo a parcialidade são elementos deturpadores e reveladores de sua natureza. Era para denunciar abertamente, ser verdadeiro e autêntico, mas não é. É um esteio também fragilizado e que fragiliza a Democracia em todo o mundo.
 
O terceiro poder, o Executivo é altamente discutível. Falemos então do Brasil. Vejamos o caso dos petistas, mais notadamente José Dirceu e José Genoíno. Eu não sinto alegria nenhuma em vê-los presos. São pessoas que fizeram mais bem à nação historicamente do que mal. O bem que fizeram durante a Ditadura supera em diversos pontos o mal que fizeram em repetir um padrão evidente em todos os campos políticos. A justiça age de acordo com provas cabais, burocráticas e processuais. Não houve jamais uma tentativa real para endurecer a vida dos ladrões políticos.
 
Não estou dizendo que Dirceu, Genoíno e Cia não mereçam o que estão passando, mas dizendo, afirmando que, sob o ponto de vista de justiça real e plena, eles estão sendo vítimas de uma jurisprudência no mínimo parcial e no máximo injusta, porque sobretudo espetaculosa. Levantem-se as fichas criminais dos parlamentares atuais (não vou pedir sequer que se retroaja aos últimos 30 anos) e verão que 7 em cada 10 cometeram crimes muito mais graves do que os réus do mensalão.
 
É claro que uma coisa não justifica outra, mas também é claro que o processo investigatório, o judiciário e a mídia trabalham com dois pesos e duas medidas para com estes que estão condenados e que a qualquer momento serão presos. Sendo que o serviço prestado ao Brasil por pelo menos dois, os mais visados pela oposição e pela opinião pública mal formada, lhes dá a prerrogativa de penas que, para mim, já foram cumpridas, dado o grau de exposição negativa dos últimos anos. E o mais grave, todos sabem que são imolados e amolados porque, no fundamento de suas culpas, susbstituem o único e verdadeiro culpado: Lula, que deveria ter esmurrado a mesa, resistido, porque tinha respaldo das urnas para isso. Aqui está o maior equívoco democrático: os poderes se toleram e se alimentam de suas vicissitudes permanentes e reincidentes.
 
Nesse particular vemos a turma do PT e outros correlegionários falando asneira porque estão ressentidos, mas não tendo a clareza e a coragem de dizer que o PT fez o mesmo que todos quando tinha o dever moral e histórico de fazer a diferença. Ressentimento não resolve esse dilema. A ética partidária e política teria evitado. Dirceu e Genoíno não roubaram, a gente sabe, apenas capitularam à gangrena dos bastidores de um poder legislativo corroído e viciado em mamatas, conchavos e roubalheira, pelos quais negociam e loteiam as decisões de um poder Executivo quase sempre refém da representatividade emblemática de todos os tempos. Doutra parte a opinião pública, manobrada pela mídia partidarista e venal, julga, condena e fica indignada, mas sem saber da missa um terço.
 
Depois, há os eufóricos pela condenação que são todos os partidos que sonham com a tomada do poder, não porque queiram prestar serviços dignos à Democracia e à população, mas porque querem a oportunidade de fazer coisa semelhante ou até pior do que aquilo que pseudamente atacam. Neste grupo inclua a oposição de araque e principalmente o PSDB, esta lástima, que originou essa bandalheira, com a compra de votos para a reeleição de FHC e com sua privatização de cartas marcadas.
 
Deixei por último, as manifestações. Os jovens e depois parte da população foram às ruas por que e para que? Dizem que por causa do Passe Livre. Depois por causa da Corrupção. Também pela PEC 37 e pela Cura Gay. Acrescentaram-se diversas reinvidicações. Foi belo e democraticamente espetacular. Não fossem os vândalos e tudo teria sido perfeito, exceto pelos detalhes estruturais que apontarei. As manifestações querem mesmo mudar o país? Como? Com quem? Querem abalar o Congresso corrupto, venal e inescrupuloso? Ótimo. Querem retirar o PT do Governo Federal? É um direito. Mas, a crise da Democracia está exatamente nas pessoas, nas instituições, na representatividade, nos maus hábitos políticos, na corrupção. Existe um ideário prático para se corrigir isso? Não. Não existe. Nós estamos perdidos, aturdidos e a mercê dos covardes, dos criminosos que representam a humanidade em todos os parlamentos. Corremos o risco de engrossarmos fileiras nas ruas e sermos vítimas de aproveitadores e de bandidos não políticos,  já que os bandidos políticos usam a demagocia para nos agredir.
 
É magnífico ver os jovens com bandeiras, com faixas, gritando palavras de ordem, querendo mudança. Isso é impagável, porém nós só temos uma saída honrosa para a democracia: nos tornarmos o quinto poder na rotina política. Nosso poder é o da pressão das ruas, mas sem máscaras, sem violência, sem picuinhas e manobras desse ou daquele grupelho. Se perguntarem: vocês querem o poder? Sim queremos o poder, não para nós. Queremos um poder que funcione limpo, seja com quem esteja lá, mas definitivamente queremos que o poder nos devolva ou mais precisamente nos proporcione conviver com o verdadeiro espírito da Democracia. Aí sim, terei muito gosto de confeccionar com o labirinto nordestino que aprendi quando criança, a minha própria bandeira e vestir-me nela com todos os meus sonhos de liberdade, igualdade, justiça, dignidade e paz.