Farsa, falsários e golpistas

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O impeachment ou o golpe (a gosto do freguês) mostrou que o povo brasileiro não sabe o que quer, pensa que sabe e rumina sobre conjecturas, como se fossem verdades cristalinas. 

Este povo também facilmente é enrolado pelos manipuladores dos fatos, sejam do governo, da mídia, das classes dominantes ou dos ideólogos de araque. 

A tomada do poder, em forma de farsa, ilustra a assertiva acima de maneira inequívoca. 

Quem conhece um pouco de História sabe que o único movimento de rua realmente lúcido e lógico ocorreu na luta pelas Diretas Já, antes dos anistiados passarem a governar o país. Depois disso, o que houve foi um conjunto de manipulações, em que as versões subvalorizaram os fatos e a inteligência de um povo que tem preguiça de pensar e também tem péssima memória. 

No impeachment de Collor, os caras pintadas têm a desculpa de vivenciarem uma democracia bebê, que ainda se arrastava e, embora a vitória dele tenha sido uma fraude, impetrada pela Globo e por setores influentes da sociedade, havia contra ele, fatores terríveis e provas de crime. 

Os manifestantes de agora não possuem desculpas nenhumas, a não ser o fato de que, movidos por manobras de bastidores, por movimentos ditos populares, mas apenas grupelhos, como o MBL, Vem Para a Rua e Revoltados Online, incharam de ódio contra alguns efeitos das gestões petistas e contra seus quadros, esquecendo-se de que as lutas realmente válidas visam ao combate das causas, em geral. 

Estas causas são anteriores a Collor, talvez são de muito longe na mentirosa história brasileira. 

O problema de entendimento começa quando pensáramos que FHC e outros anistiados fariam uma política diferente. Não fizeram, corromperam-se e corromperam, tanto quanto as figuras e partidos anteriores. Não houve luta contra FHC, apenas algumas investidas partidaristas do PT para retirá-lo do poder, principalmente no episódio da compra de votos para a emenda da reeleição. 

Mas, os escândalos, a roubalheira e a safadeza política não mudaram de cor e o toma lá dá cá esteve vigente, sem combate de fato. Os oito anos tucanos causaram tanto prejuízo ao país, quanto os treze anos petistas, mas, as forças que elegeram Collor e que eram contra Lula e PT fizeram seus leitores, ouvintes, telespectadores e afins, acreditarem nas versões de modo que Lula, PT e Dilma passaram a ser e serão ainda, durante muito tempo, os vilões de uma história recheada de vilões sombrios que nunca saíram das sombras dos bastidores e que os manifestantes pró-impeachment insistem em ignorar. 

Lula se elegeu por um partido que tinha tudo para ser diferente, mas para comprovar pela enésima vez, que Direita e Esquerda fazem parte do mesmo monturo humano, nada mudou e a roubalheira, a corrupção, o jogo de cena e a bandidagem foram copiados, reproduzidos e, em alguns casos, aprimorados. Entretanto, por se tratar de gente que deveria fazer certo e fez tudo errado, agora está mais fácil para os manifestantes e a população venderem a ideia de que o Brasil está mais limpo, porque se livraram dos vermelhos. Não está. O PT e seus chefões são minoria nessa roubalheira e todos sabem disso, roubaram muito, mas muito menos do que os que estão ilesos, com as contas cheias em paraísos fiscais ou com bens em nomes de laranjas. Perto disso, o pretenso triplex do Guarujá e o sítio de Lula são ranchinhos de beira de roçado. 

Mas, as versões são poderosas e parte dos brasileiros inflou um ódio tão grande que até há quem queira que apoiemos Temer, querendo nos convencer de que ele é um mal menor do que os figurões do PT. Mal sabem que o PMDB sempre foi um dos quadros mais corruptos do Brasil e não é de agora, é assim desde que se chamava MDB. 

Em 2006, tentaram retirar Lula, via mensalão e não conseguiram, sendo que naquela ocasião já era um absurdo que se ignorassem o mensalão tucano e outros crimes tucanos e do DEM que foram para debaixo do tapete. 

De lá para cá, todos os setores derrotados nas urnas se voltaram para um só objetivo: acabar com Lula, PT e derrubar o governo, erroneamente chamado de Esquerda. Basta ver os aliados e se sabe que, embora tivesse codinome de esquerda, o governo petista foi no mínimo de centro direita, cambaleando, de vez em quando para alguma beira da Esquerda. 

Esta é uma verdade que as pessoas de Direita (de má fé) não contam e as de Esquerda fazem vistas grossas. Então, perderam de novo em 2010, um absurdo, mas perderam e os tucanos principalmente não aguentavam mais ficar tão longe do poder central. Assim, em 2014, a jogada foi pesada e perderam de novo, seja por força de mentiras dilmistas e petistas, sejam por vontade mesmo da maioria, pequena, mas maioria, perderam de novo e os tucanos não aguentaram, seus eleitores também não, notadamente os de São Paulo e do Sul. 

Foi fácil montar a farsa do impeachment, preparada por um ex-petista ressentido, um jurista funcionário do PSDB e por uma mulher ligeiramente estranha, para dizer o mínimo. Foi fácil obter respaldo de parte da população, isto aliado à crise econômica e do desemprego que serão uma constante, daqui para frente, em qualquer governo. Daí para surgir uma peça fictícia de um crime de responsabilidade foi um pulo. Daí que nos bastidores, já vinham orquestrando o golpe, pela parcialidade de Moro e pela traição de Temer e de seus aliados. Foi fácil emplacar o impeachment pelas mãos de Cunha, o limpo, e foi fácil comprar o apoio de Renan, o ético, e contar com a subserviência do ST.

Foi fácil chegar à impressão de que tudo era legal, apesar de estupidamente ilegal. 

Discordo de quem acha que tudo correu legalmente e que Temer é legítimo, porque era o vice de fato e que quem votou em Dilma votou também nele. É por isso mesmo que ele é ilegítimo. Participou da mesma campanha, dos mesmos acordos, dos mesmos arranjos obscuros dos bastidores. Assinou, inclusive, algumas das pedaladas. 

Discordo de quem quer nos convencer que ele mereça algum apoio. Não merece. É um golpista e será eternamente golpista, ainda que tenha ajudado na queda de um governo que merecia cair, mas não pelos motivos apontados na peça do impeachment e não pela forma como tudo ocorreu. 

Esse povo foi às ruas com ódio para se vingar de bandidos que tinham a mais apenas a falsidade ideológica, porque tinham de fazer o certo e optaram pelo o errado, seguido por todos os políticos de Direita, sempre. 

Então, não entendo as mentes obtusas dos defensores da Direita, como não entendo as mentes obtusas da Esquerda. Entendo de humanidade e para a humanidade, é necessário apenas que todos nos definamos como pessoas inclusivas, corresponsáveis pelo bem estar de todos. Fora disso, é crueldade política e equívoco gerado por opiniões inconclusas, vulgares e muitas vezes perversas. 

Discordo de quem pensa que quem foi contra o impeachment seja apenas esquerdopata. Doença é também os princípios e a prática de Direita. É doença tudo que não enxerga, no quadro geral da sociedade, cidadãos comuns que merecem respeito e cuidados. 

Quem esteve e está contra o impeachment, e conheço muitos, talvez até uma extensa maioria, pensou e pensa, sobretudo, na Democracia e foi contra esta que os manifestantes jogaram e agora querem que façamos o restante do serviço sujo, apoiando um corrupto de mesma estatura dos perseguidos e presos e enxotados do poder, adquirido via urnas. 

O que houve no Brasil foi uma farsa terrível e uma afronta à Democracia. 

Deixei por último o juiz Moro, porque também tentam vender a ideia de que quem está contra ele está contra o Brasil. Não, quem está contra Moro está contra a parcialidade jurídica. Seu trabalho não é justo nem completo. É terrível e assustador, porque, com dados graves sobre todos os bandidos, definiu-se por investigar e prender apenas alguns, segundo suas intenções, sabe lá porque, para que fossem notícia e execrados publicamente. Isto contribuiu para que a farsa do golpe tivesse respaldo popular. 

Então, não se é contra Moro ou contra a Lava Jato, mas completamente a favor de métodos justos e imparciais da Justiça, o que não há nem em Moro nem no STF, onde vê-se uma tendência a congelar toda e qualquer condenação de pessoas que não sejam do PT e dos seus aliados. 

É por isso que é impossível achar que está tudo bem no Brasil. Em verdade, nunca esteve tão ruim, desde que as manifestações pelas Diretas já saíram vitoriosas das ruas, onde eu estava, em vivo e em cores. 

Sinto-me devastado e triste, não pelo Tchau, querida!, mas pela mancha subliminar que a democracia carrega hoje na sua essência.