Crônica dos 21 anos de casado

Bodas de Zircão.

Ocorreu ontem e nós não conversamos a respeito. Ele não gosta de exposição e estávamos, como sempre, ocupados. Ele com seus afazeres belos, ornamentando os espaços das vidas das pessoas. Eu, com um pensar remexido mil vezes, para ver como melhoro o que parece não ter cura: os desarranjos de um mundo que recebe do mundo interno das pessoas, os reflexos de rotinas mal vividas, mal sentidas, mal espelhadas quanto ao bem de todos. Eu me ocupo de pensar sobre o que dizer para mim mesmo que possa me alinhar a um viver bom, mesmo no caos.

Voltados para nós para nos voltarmos para tudo e todos, como meta de vida, eis o nosso estilo existencial.

Neste ano não coloquei fotos, não queria nem falar. Tenho visto tanta exposição gratuita e ele sempre me diz: "não tem de colocar nada lá", lá é o faceboock que o meu pendor jornalístico não evita.

Respeito o meu amado, que é um cara de fazer e não de de dizer.

Viemos no carro ontem, tarde da noite para a Tribo de Estrelas, cansados e úteis, como sempre nos vimos, na maior parte destes 21 anos juntos. Esta tribo é o que revela quem são os nossos amigos reais e o filtro desta tribo é tão espetacular que a gente não faz nada para os amigos dela se tornarem nossos e os adversários ou críticos dela, nos ensinarem o crivo amoroso das amizades fundamentais.

Ele, mais jovem 18 anos, me ensina a ser uma pessoa atuante, eu aprendo que atuar como ele é um ofício para os bons e eu sou apenas razoável.

Às vezes, penso que não o mereço, mas vou fazendo o melhor, embora, pensando muito mais e ele fazendo muito, muito mais, por mim e por todos.

Ele é o serviço abnegado em corpo e coração.

Muitos pensam que é fácil, não tem sido, nunca foi fácil. Manter um relacionamento verdadeiro custa mudanças incontáveis, boa vontade e clareza de sentimentos.

Meu amor por ele é cristalino como o zircão, que é o mineral símbolo destas bordas do virar das duas décadas, de conheceres e saberes um do outro recíprocos.

Parece um diamante que, na transparência, indica que para estar junto de verdade a gente tem de derrubar os biombos do fingimento e se mostrar tão inteiro, que qualquer olhar inquieto trinca algo para, em seguida, compreendermos a necessidade de um conserto afetuoso.

Viver com ele tem sido para mim um exercício de aperfeiçoamento, estar casado com ele, trazer seu nome na certidão de casamento é de uma responsabilidade gigantesca, porque eu e ele sabemos o quanto tem sido bom e cheio de trabalho por nós e por todos.

Somos um casal com filhos que nos adotam, irmãos que nos consideram, pais que se tornam por circunstâncias não planejadas e sogros que nos contemplam sem a gente saber, todos espalhados por onde passamos. Cada pessoa que conhecemos é um velador das nossas alianças, gente que tem a gente como uma espécie de reforço ou complemento das suas famílias.

Por isso, não podemos estar frágeis, não podemos ruir, embora saibamos que não somos infalíveis ou imprescindíveis.

Nossa luta interna e externa é para nos mantermos decentes, um diante do outro e os dois diante de tudo e todos, com a exemplaridade que sonhamos para toda a humanidade.

Um projeto de vida a dois que inclui muito, desde a Tribo de Estrelas até quem a gente ainda não conhece.

Às vezes não entendemos, porque é tão difícil, porque tanta gente, em silêncio, torce contra, talvez seja para exercitarmos a compaixão e para notarmos que estamos longe da perfeição ou algo parecido.

Eu e ele não podemos errar apenas, temos de, mesmo errando, mudar o erro para zilhões de acertos exemplares.

Temos procurado rir mais e quando choramos a dois, é porque fizemos o melhor para todos. Tem sido assim.

O zircão, símbolo destas bodas, aparece na cor amarela, o que indica que temos de estar sempre a um passo da sabedoria existencial e nem sempre conseguimos tomar decisões sequer razoáveis, mas tentamos.

Outra coloração é a vermelha e nesta, a gente se enquadra bem, pois, o vermelho é a cor do servir e da paz, eis algo que a gente tem sido sem exaltação alguma.

Mas, na coloração verde é que o zircão nos revela, porque temos um compromisso de sermos leais e verdadeiros entre nós e diante de todos.

Por fim, o poder do zircão em resistir aos movimentos mais fortes da terra sem alterações danificadoras da sua inteireza, mantendo-se firmemente naquilo que é. Isso nos revela. Não vamos desistir do que sonhamos, portanto, nós e a Tribo, sempre estaremos aqui, ali, no Cosmo, disponíveis e reais.

Faremos adaptações, mudaremos tudo que for preciso para não mudarmos nada no que tem sido grandioso entre nós e feito de nós este casal simples e que trabalha pela justeza das nossas vidas a serviço de outras vidas.